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Foto do escritorSelma Bueno Alves

DOENÇA PSICOSSOMÁTICA - OS AJUSTES DISFUNCIONAIS DA INFÂNCIA, INTERFERINDO NA VIDA ADULTA.

Atualizado: 21 de mai. de 2022


RESUMO


A psicossomática é uma doença de raiz emocional, ela está ligada diretamente a forma como o sujeito vê o mundo e como ele se ajusta a esse mundo, sentimentos e pensamentos. A Gestalt terapia é uma abordagem fenomenológica existencial que busca abordar a realidade humana a partir do todo, de um campo unificado. Para Gestalt-terapia o desequilíbrio é o estado natural das coisas, a harmonia interna de cada sujeito é diferente do outro. Pensamentos e sentimentos são indissociáveis, assim como as memórias, chegam acompanhadas por afetos. A forma como a família se inicia, a gestação, e mais tarde, o cuidado dispensado a criança, acabam por influenciar a vida desse pequeno ser. A família é a primeira forma de contato que a criança tem, a forma como essa família lida com a criança faz com que ela se ajuste criativamente. Ajustes pouco criativos deixam falhas no amadurecimento causando, muitas vezes, dores e sofrimento para toda a vida. O sujeito se ajusta ao campo em que vive através do contato. Em um fundo de possibilidades do campo, uma figura se destaca e toma forma, uma necessidade que aparece e é atendida fechando a Gestalten. Em um contato não saudável, o sujeito não percebe a diferença entre ele e o outro, ou entre ele e o ambiente, não satisfaz suas necessidades e seus ajustes criativos tendem a se tornar falhos, deixando lacunas na fronteira de contato. Na relação dialógica o EU se atualiza na presentificação do TU. O EU como pessoa e TU como o OUTRO é respeitado. Ambos devem estar disponíveis para um diálogo genuíno. É no encontro que temos a possibilidade de crescimento e transformação. Os conceitos aprendidos durante a vida fazem com que o indivíduo funcione com ideias pré-concebidas o que o afasta de seus próprios sentimentos e necessidades. Cada situação inacabada do passado, vem e assume a predominância para dominar a situação atual e completá-la, a angústia da pessoa exige sua atenção, organismicamente, a consciência percebe a necessidade de controlar o problema. Ajustamentos disfuncionais dificultam a vida do sujeito, as cristalizações formadas na infância moldam sua forma de agir, que acabam consumando um adoecimento. As cristalizações na fronteira de contato estariam relacionadas aos cuidados inadequados, oferecidos ao sujeito, enquanto ainda criança.

As memórias guardadas de cada acontecimento são inconscientes, a neurociência explica que a memória inconsciente envolve diversos sistemas cerebrais: a associação de sentimentos a eventos ocorridos e envolve uma estrutura denominada amígdala; a amigdala controla os efeitos dos neurotransmissores sobre a memória. Este artigo é uma revisão literária sobre doenças psicossomáticas e sua raiz na infância. Nele buscaremos identificar traumas da infância, que permaneceram na vida adulta, dificultando a performance da pessoa e desencadeando as doenças chamadas de psicossomáticas. Procuraremos ligar as cristalizações da infância com o adoecimento na vida adulta. Buscaremos apresentar formas de minimizar as dores dessas pessoas através da psicoterapia.


1. INTRODUÇÃO


A psicossomática segundo Melo Filho, 1992, pag19: “é uma ideologia sobre a saúde, o adoecer é sobre as práticas de saúde, é um campo de pesquisa sobre esses fatos e, ao mesmo tempo, a prática, uma prática da medicina integral”

A psicossomática é uma doença de fundo emocional que altera a forma de vida da pessoa. Doenças como asma, dermatites atópicas, câncer infantil, obesidade e fibromialgia, dentre outras, trazem na constituição de vida do sujeito dificuldades de relacionamento com a família de origem desde a mais tenra infância.

De acordo com a Psicanálise, a forma como os pais lidam desde a gestação faz com que o sujeito se ajuste para a vida desenvolvendo traumas iniciais que, ao não serem compreendidos, passam a acompanhá-los por toda a vida. No tempo de constituição subjetiva que acreditamos poder encontrar a chave para a compreensão do sintoma somático, visto que é na pequena infância que o corpo simbólico e imaginário se forma nesse duplo com o corpo anatômico.

A Gestalt terapia vê a doença psicossomática como uma forma de ajustamento, uma autorregulação do organismo, a doença reflete um comprometimento na capacidade do sujeito de fazer escolhas, então, esse sujeito cristaliza uma determinada resposta do organismo projetando como fantasia no presente. Ele não consegue agir de outra forma, dar outra resposta. O outro me afeta e eu me ajusto para que possa lidar com essa forma de atenção dispensada a mim.

Desde a gestação a mãe passa para o bebê todas as emoções que ela própria vive. Como foi essa gestação? Foi desejada, programada? Foi a causa da união? Foi imposta ou desejada por apenas um do casal? Como transcorreu? Como foi o parto? São muitas perguntas que irão desde cedo dando forma ao bebê.

Ao nascer o bebê precisa ter suas necessidades satisfeitas com afetividade e consciência, ele precisa de oportunidades para percorrer seu caminho com autonomia seguindo para a vida adulta.

Deve existir uma pessoa que faça com que o bebê se sinta confortável e confiante, uma pessoa que ofereça limites e confrontos, acolha sua vulnerabilidade e que dê oportunidade a ele, de concertar possíveis erros.

A doença psicossomática é dotada de certa complexidade. É o desencadear de dores pelo corpo, tremores, falta de ar, coceiras, dermatites, gastrites, batimentos cardíacos acelerados, queixas de dores generalizadas etc. A pessoa apresenta sintomas que não podem ser explicados por nenhuma alteração orgânica, nos exames para confirmação diagnóstica, não aparece nenhuma doença que cause esses sinais.

A pessoa passa a ir à emergência dos hospitais ou médico especialista, sem ser diagnosticada com nenhuma doença propriamente dita, mas as dores e sintomas estão presentes. Os sintomas são tão reais que o médico tem dificuldades em dizer se é verdadeiramente uma doença ou não.

As causas das doenças psicossomáticas estão especialmente ligadas a experiências ruins e traumas não superados durante a vida. As emoções negativas vividas afetam a capacidade da coordenação cerebral, o que impede a liberação de substâncias importantes para ao ajuste fisiológico do organismo. Mente e corpo passam a se conhecer. A doença é uma situação inacabada que acaba somente com a cura ou a morte.

Se devidamente diagnosticada e tratada podemos ter melhora da saúde mental, a diminuição das idas a hospitais, melhorando assim a qualidade de vida da pessoa. Conhecer o próprio corpo e seus traumas pode facilitar a vida do sujeito e diminuir as possibilidades de uma infinidade de problemas que ligam traumas da infância a doença psicossomática na vida adulta.

O objetivo geral é investigar as dificuldades encontradas na vida de pessoas que apresentam doenças psicossomáticas e linca-las a traumas passados. Demonstrar que a criança aprende desde muito cedo a se ajustar na vida e que, a depender, da forma como ela é tratada isso pode deixar marcas que perdurarão para sempre em sua vida. Buscar formas de minimizar as dores destas pessoas através da psicoterapia.



2. METODOLOGIA


A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica com foco na revisão literária, foram feitas buscas de artigos nas plataformas: BDTD, LILACs, BVS e Google acadêmico. Pesquisa qualitativa com objetividade no descrever, a hierarquização e a precisão ao contextualizar a busca por resultados fidedignos.

A frase utilizada para pesquisa foi “Gestalt e a psicossomática na infância” não havendo resultados nas plataformas foi retirado o nome Gestalt onde, no acervo de 2005 a 2021 da BDTD, foram encontrados 15 artigos, dos quais 4 foram descartados e 11 escolhidos por conter uma das palavras da frase utilizada. Foram feitas buscas nas plataformas LILACs e BVD, sem sucesso para as palavras escolhidas. No google acadêmico dez artigos foram selecionados e separados por conter todas as palavras-chave ou parte delas.

Os artigos encontrados na BDTD por serem totalmente referenciados a teoria psicanalítica decidiu-se que não serão utilizados. Assim os dez artigos encontrados no Google Acadêmico servirão base para as discussões no trabalho. Além dos livros específicos usados para embasamento da Gestalt-terapia.



3. FUNDAMENTAÇÃO TEORICA


3.1 A PSICOSSOMÁTICA


O termo Psicossomática é a junção de SOMA e PSIQUE em psicanálise, em Gestalt o PSIQUICO e o SOMÁTICO, o que é da psique e o que é do soma. Uma junção do sujeito como ser único e não divisível. Segundo de Capra (1982), uma abordagem de embasamento holístico na saúde, no tratamento e na cura está de acordo com pensamentos e paradigmas mais tradicionais, bem como é coerente com as teorias científicas modernas.

Alexander usa o termo Psicologia Gestáltica, ao se referis a Köhler, Wertheimer e Kofka quando fazem sua crítica a psicologia analítica individualista quando formularam a tese de que:

... o todo não é o resultado da soma de suas partes, mas sim algo diferente destas, e que o sistema como um todo nunca pode ser compreendido a partir do estudo de partes isoladas; que, de fato, justamente o oposto é que é verdadeiro – as partes só podem ser inteiramente compreendidas após ter sido descoberto o significado do todo. (p.32)

Para Alexander, 1989, devemos ter em mente que cada sintoma orgânico tem um significado emocional para o paciente, do qual o ego tira proveito para o alívio dos conflitos emocionais. (p.202)

Para Gestalt terapia o desequilíbrio é o estado natural das coisas, a harmonia interna de cada sujeito é diferente do outro, temos prazeres e gostos diferenciados, assim se forma o ser completo e individual.

Quando o sujeito se percebe muito doente, passa a prestar atenção a seu corpo. Ele não entende por que está adoecendo, não entende o que está fazendo e nem o porquê as dores acontecem. Ele então vai ao médico que, considera ser uma patologia funcional, sem qualquer dano fisiológico ou anatômico, o médico prognostica não haver nada de sério com ele e dá uma solução paliativa.

As dores não são curadas com cuidados paliativos e o sujeito começa a prestar atenção em seu corpo, agora sua personalidade passa para o fundo e dá voz para seu corpo. Mente e corpo passam a se conhecer. A doença é uma situação inacabada que acaba somente com a morte ou a cura.

A psicossomática é uma forma de usar a doença como expressão de linguagem para se obter a satisfação do corpo. Segundo Perls, 1988, pg 25:

A mente antes era considerada exclusivamente como fonte da razão, agora se torna também, sede do obscuro inconsciente é uma estrutura capaz de exercitar sua vontade não apenas sobre o corpo, mas sobre si mesma. Deste modo pode reprimir pensamentos e recordações que ache desagradáveis. pode mudar sintomas de uma área do corpo para outra. É o pequeno ex-machine que nos controla todos os sentidos.

O adoecimento é uma situação em que o sujeito se vê em um contexto que deixou de ser favorável para si e provoca uma obstrução em sua fronteira de contato. A medida em que cuidados não são oferecidos na infância, ele prossegue na vida adulta com essa lacuna, essa obstrução, que não o permite fluir livremente.


3.2 O HOMEM


Em Descartes (1983) vemos a filosofia cartesiana conceber o homem com duas substâncias (corpo e mente) distintas em sua essência e independentes por princípio, o pensamento é dado por Deus e o corpo é submetido às leis do movimento e da mecânica, assim como todos os objetos físicos que encontramos no mundo, um corpo sem alma como mera materialidade.

O foco passa a ser a anormalidade biológica, a classificação, os aspectos universais da patologia, onde a loucura deve ser tratada de forma nosológica, a psicopatologia baseada em modelos biomédicos. A loucura se transforma em doença mental e é passível de tratamento médico. O corpo para Descartes é uma máquina animada por uma alma, que pode ser dissecado e analisado.

Para Heidegger o homem é diferente, ele fala da cegueira da ciência positivista, que não permite que o homem se revele em sua fenomenologia. O filosofo utiliza a palavra alemã Dasein para se referir ao ser humano. Traduzindo DAISENDa” significa “aí” e “sein” quer dizer “ser”, portanto, “ser-aí”, numa interpretação heideggeriana, o homem é aquele ente que está presente no mundo de forma peculiar.

Um ser aberto para sua própria experiência de existir, o homem tem autoconsciência, ele temporaliza, tem noção de que vive, mas não sabe o que irá acontecer com ele, daí sua angústia existencial e a necessidade de construir um sentido de vida.

Heidegger fala da necessidade de um modo próprio de aproximação do humano que possibilite enxergá-lo em sua complexidade e não como soma e psique. Ainda, segundo ele, o modelo cartesiano aplicado ao homem divide, separa e o empobrece em sua humanidade.

Para Heidegger o corpo é sempre um modo: o modo-singular-de-ser-do-homem-no-mundo, o fenômeno do corporar não pode ser mensurado, corporar é a minha relação direta com o mundo, é o horizonte existencial no qual eu permaneço.

É necessário um olhar que possa compreender o homem em sua complexidade e inteireza. Sem separar para depois agrupar, uma metodologia que já de início contemple o ser-homem existencialmente-no-mundo.

Para o Holismo o homem funciona de duas maneiras: no pensar e no agir e assim, somos forçados a pensar em um modo estrutural, onde a mente é a sede da unidade estrutural. PERLS, 1988, p.24:

m dos fatos mais notórios a respeito do homem é que ele é um organismo unificado. E, todavia, este fato é completamente ignorado pelas escolas tradicionais de psiquiatria e psicoterapia que, não importa como descrevam seu enfoque, continuam a operar em termos da velha cisão corpo/mente. Desde o surgimento da medicina psicossomática, a estreita relação entre atividade mental e física se tornou cada vez mais flagrante. E não obstante, essa persistência do paralelismo psicofísico, este avanço no conhecimento, não progrediu tanto quanto deveria. Continua preso aos conceitos de causalidade, tratando a doença funcional como um distúrbio físico causado por um fato psíquico.

Pensamentos e sentimentos são indissociáveis e assim como as memórias chegam acompanhadas por afetos. A visão mente e corpo integrados resultam no comportamento do sujeito e abrange a complexa relação de fatores biopsicossociais, afastando-se das explicações causais alinhadas e aproximando a mente do dialético.



3.3 A GESTALT-TERAPIA


A Gestalt terapia é uma abordagem fenomenológica existencial que busca discutir a realidade humana sem partir de estruturas psíquicas, Perls (1997) mostra uma visão de homem com sua abertura, liberdade, possibilidades, criatividade, auto-organização e que busca seu sentido de vida.

Para Perls, podemos estudar os processos fisiológicos ou psicológicos, mas este entendimento de estruturas e mecanismos não é a compreensão da vida, mas seria sua abstração.

Ainda para Perls (1997), o ser humano tem a possibilidade de ser-no-mundo de várias maneiras e em níveis qualitativamente distintos. Ele assinala o nível do pensar e o nível do agir.

E, segundo Perls 1997, sofremos de um sentimento de desconexão visto que experimentamos o eu (pensar/sentir), o corpo e o mundo distintamente.

"[...] Suponha agora que ele tenha muitos motivos para chorar. Todas as vezes que se emociona até ficar à beira das lágrimas, ele, não obstante, não ‘se sente com vontade de chorar’, e não chora; isto é, porque se habituou, há muito tempo, a não perceber como está inibindo muscularmente essa função e cortando o sentimento - pois há muito tempo esse sentimento levou-o a ser humilhado e, até mesmo, surrado. Em vez disso, ele agora sofre de dores de cabeça, falta de fôlego, e até de sinusite. (...) Os músculos dos olhos, a garganta e o diafragma são imobilizados para impedir a expressão e a awareness do choro que está vindo. Contudo, esse auto contorcer-se e auto sufocar-se provocam excitações (de dor, irritação ou fuga) que devem, por sua vez, ser bloqueadas (...) Finalmente, quando ele começa a ficar muito doente, com fortes dores de cabeça, asma e acessos de vertigem, esses reveses lhe chegam de um mundo completamente estranho: seu corpo. (PERLS, 1997, p. 78)


3.3.1 O campo


O campo está sempre em transformação, uma experiência é provisória, e todas as partes do campo são relevantes para uma completa inteiração entre organismo e ambiente e não podem ser descartadas.

Para a teoria organísmica de Kurt Goldstein, qualquer evento que acontece no campo reorganiza esse campo, por meio de uma compensação fisiológica, sensorial ou motora, para que as necessidades do sujeito sejam atendidas. Aqui os mecanismos adaptativos são desenvolvidos. A cada experiencia o organismo se autorregula elegendo um ajustamento para as condições em que se encontra.

Perls (1997) define “campo unificado” como instrumento para o entendimento global homem, caracterizando-o como um ser no qual ações físicas e mentais estão entrelaçadas, como um “organismo total”. Isto sugere que a pessoa vive no mundo num constante processo de autorregulação organísmica o que exclui os problemas causados pelas denominações de soma e psique.

O fluxo natural da autorregulação, pode ser dificultado por “situações inacabadas”, quando se tenta naturalmente completar as sequencias para um processo de fechamento de Gestalts e autorregulação organísmica.

O organismo sempre trabalha como um todo, não somos a soma das partes, somos a coordenação destas partes, uma coordenação sutil de todos os diferentes pedações que compõe o organismo.

Saúde é o equilíbrio apropriado da coordenação de tudo o que somos. Pelo aspecto ecológico não separamos organismo de ambiente, assim como as plantas, os organismos não sobrevivem fora do habitat natural, sem oxigênio ou comida.

O nós não existe por si só, mas, se constitui a partir do EU-VOCÊ e é o limite entre as duas pessoas que se encontram. A sociedade exige educação desenvolvimento intelectual, oferece recompensas aos bem desenvolvidos. Cada cultura cria suas imagens e conceitos comportamentais, um ideal de como o indivíduo deve funcionar, uma referência, o que provém em gastos de energia.

Os conceitos aprendidos durante a vida fazem com que o indivíduo funcione com ideias pré-concebidas o que o afasta de seus próprios sentimentos e necessidades. Quanto maior a discrepância entre o que pode se tornar, seu potencial inato, e os conceitos idealistas maior será o esforço e maior será a possibilidade de fracasso. “Exigências de perfeição limitam a capacidade do indivíduo de funcionar dentro de si mesmo, na situação terapêutica, bem como em outras situações sociais” Perls, 1975, pg.21


3.3.2 Figura e fundo


No processo de awarness uma figura se forma, o surgimento de um excitamento do campo, algo se destaca, flui do fundo para a figura abrangendo o fisiológico e o emocional. A figura então passa a ser aceita e se diferencia do fundo, torna-se vigorosa e brilhante. Se houver interrupção a Gestalt não se forma, o fundo impede que a figura se consolide, deixando-a turva, nublada.

A formação de figura e fundo é descrita por Monica Botelho Alvim como “Fluxo da experiencia aqui-agora que, a partir do sentir e do excitamento presente no campo, orienta a formação de Gestalten, produzindo um saber tácito que denominamos, saber da experiência.” Frazão e Fukumitso 2014, pag.23

Ao longo do dia as figuras se abrem e se fecham formando o que chamamos de Gestalen. No campo experienciado algo se destaca, em um fundo de possibilidades, aos poucos vai tomando forma e contorno, a figura percebida. Quando ela se completa nitidamente, pega toda a atenção do sujeito e requer a atenção necessária.

Uma Gestalt é formada de modo a ter somente uma figura em primeiro plano, só pensamos, basicamente em uma coisa por vez. Desse modo quando duas figuras quiserem tomar posse de nosso organismo, ficamos confusos, divididos e fragmentados.

Para se alcançar o fenômeno que o sujeito dá a sua figura, será necessário o reconhecimento e suspensão de ideias pré-concebidas do comportamento observado, integrando, assim, a descrição do comportamento, o que é revelado pela situação e não pela interpretação de quem o observa.

Descrever, não explicar, trabalhar na experiencia da situação para que a awarness sensorial descubra o obvio. Acolhendo o que o outro manifesta. Quando a pessoa não se permite ser totalmente livre ela encolhe sua fronteira do ego, com a diminuição dessa fronteira, a energia da pessoa também diminui, enrijecendo sua capacidade de lidar com o mundo.

Cada situação inacabada do passado, vem e assume a predominância para dominar a situação e completá-la, a angústia da pessoa exige sua atenção, organismicamente, a consciência percebe a necessidade de controlar o problema. Entretanto, esse processo exige algo novo do ambiente, assim, as figuras de consciência se tornam vividas e vêm para o primeiro plano fazendo um novo contato, em uma situação de perigo, a cautela e deliberação são igualmente espontâneas.

A pessoa neurótica não relaxa, ela sempre enxerga a situação como verdadeira, sempre avalia de forma obsoleta, assim se ajusta espontaneamente, sua autorregulação considera a situação perigosa e ela se torna cautelosa.

Existe uma hierarquia na dominância das situações, os elementos mais importantes vem em primeiro lugar e para esses elementos, respondemos primeiramente. A doença, as deficiências e os excessos somáticos têm valor elevados na hierarquia da dominância.

Sustentar a si próprio e evoluir, implica em independência. Independência implica em lidar com os perigos do ambiente, do amor, evitar a solidão e garantir a autoestima.

“A concepção errônea inevitável, numa emergência crônica de baixo grau é de que existe uma coisa tal como a mente torna-se mais assustadora quando começamos a sofrer de enfermidades psicossomáticas”. Perls,1997, pag. 78.

Criado na mente, amado ou desprezado, o homem não percebe que está controlando seu corpo, ele não sente a si mesmo. Ele quer fazer algo e seu corpo não deseja, pois há algum tempo, esse sentimento o fez sentir-se humilhado, e ele se habituou a esconder esse sentimento, sem perceber que está se inibindo e podando. Agora aparecem dores de cabeça, falta de ar, uma sinusite. Os músculos dos olhos, garganta e do diafragma agora estão impossibilitados de expressar a awarness necessária


3.3.3 O contato


Em Gestalt terapia, o ciclo de contato, é a forma como o sujeito se coloca no mundo. As sensações e emoções que o sujeito passa durante a vida vão deixando marcas em seu modo de contatar o outro e o mundo. Através das sensações e emoções vividas o sujeito se autorregula, em um contato saudável, formando Gestalten fortes e definidas.

Em um contato não saudável, o sujeito não percebe a diferença entre ele e o outro, ou entre ele e o ambiente, não satisfaz suas necessidades e seus ajustes criativos tendem a se tornar falhos, deixando lacunas na fronteira de contato.

Nos momentos em que acontecem as interrupções, na formação da awarness, são geradas perdas das funções do ego, alguns momentos na vida do sujeito fazem com que ele não resolva um simples problema, na formação da figura e fundo um excitamento troca a sequência fazendo com que a figura não aflore, o corpo então, se torna objeto final da agressão, o fundo, agora corrigido, fica esquecido e é mantido assim.

Para todas as interrupções existem o lado saudável e o não saudável, a depender de como a pessoa lida com a situação. Segundo Perls, 1997, pag.232

No processo de ajustamento criativo traçamos a seguinte sequência de fundos e figura: 10 Pré contato – no qual o corpo é o fundo, e o seu desejo ou algum estimulo ambiental é a figura; isto é, o “dado” ou o id da experiência; 2) Processo de contato – aceito o dado e se alimentando de suas faculdades, o self em seguida se aproxima, avalia, manipula etc. um conjunto de possibilidades objetivas: é ativo deliberado com relação tanto ao corpo como ao ambiente; estas são as funções de ego; 3) Contato final – um ponto equidistante das extremidades, espontâneo e desapaixonado de interesse para com a figura realizada; 4) pós contato – o self diminui. (Perls, Hefferline, Goodman - Gestalt-terapia 1997 Cap XIV pag. 232)

Confluência, introjeção, egotismo, retroflexão e projeção são condições de contato que fazem com que o sujeito se sensibilize ou se dessensibilize. A depender da hora onde o ciclo de contato foi interrompido o sujeito perde sua originalidade mantendo seu ciclo cristalizado impedindo que siga a vida naturalmente.

Na confluência, sem contato ou estímulos, o sujeito se dessensibiliza, paralisa, fica histérico ou regride a alguma fase anterior de crescimento. Hábitos e aprendizados são vistos como confluência, a memória disponível é vista como confluências saudável, as repressões são vistas como não saudáveis.

A introjeção é uma reação a não aceitação a excitação, uma inversão no afeto. A pessoa acaba por engolir situações, repetindo o movimento do outro como por exemplo linguagem, vestuário, plano urbanístico, de instituições. Se torna não saudável quando somos forçados a aceitar as situações impostas sem discutir.

A projeção acontece quando a excitação é aceita e o ambiente é confrontado. Se a interrupção ocorrer nessa etapa, o resultado será o de sentir a emoção, mas esta flutuará livre, desvinculada do sentimento ativo do self que vem com comportamentos expansivos adicionais. A emoção é atribuída à outra realidade possível, ao ambiente, somos atraídos por ela.

O projetor neurótico não identifica o sentimento como seu próprio sentimento, mas, vincula a alguma outra pessoa, não se aproxima nem se confronta, o que pode resultar em equívocos ridículos e trágicos. Repudia a emoção, rumina, fantasia.

O egotismo é um entrave na espontaneidade, uma fixação. Indispensável em todo processo de complexidade elaborada e de maturação prolongada; de outro modo há um compromisso prematuro e a necessidade de desencorajar o desatamento. O egotismo normal é hesitante, cético, arredio, obtuso, mas se compromete. Quando todas as bases para o contato final estão preparadas de modo adequado, há uma interrupção no processo de renunciar ao controle ou à vigilância, de ceder ao comportamento que levaria ao crescimento.

A retroflexão é o ato de se auto reformar, fazer um reajustamento, como sendo fundamento para ações imediatas, assim, sofremos remorsos, tristeza; relembramos, reconsideramos. Qualquer ato de autocontrole deliberado durante um envolvimento difícil, onde, as energias expansivas de orientação e de manipulação, estão totalmente comprometidas com a situação ambiental, seja no amor, raiva, dó, dor etc.

Esse sujeito não consegue aguentar e precisa interromper o ciclo, tem medo de ferir ou de ser ferido. As energias se voltam contra os únicos objetos seguros disponíveis no campo: a sua própria personalidade e seu próprio corpo. Evitando conflitos ou a destruição de algo, acaba por agredir a si próprio, o que reverbera em uma doença.

Na relação dialógica o EU se atualiza na presentificação do TU. O EU como pessoa e TU como o OUTRO é respeitado. Ambos devem estar disponíveis para um diálogo genuíno. É no encontro que temos a possibilidade de crescimento e transformação.

A inclusão do outro é um movimento que deve ser enfatizado para a relação dialógica, experienciar o que o outro está experienciando. É no encontro que formamos a fronteira de contato, é onde a relação acontece.

O adoecimento é uma reação do indivíduo a um contexto que deixou de ser favorável a ele e provoca falhas ou obstruções em sua fronteira de contato. As cristalizações na fronteira estariam relacionadas aos cuidados inadequados, oferecidos ao sujeito, enquanto ainda criança.

Como criança, o sujeito, deixou para traz conquistas e potencialidades que não foram alcançados no processo de construção de sua self. O ambiente não ofereceu as gratificações e frustrações necessárias para o amadurecimento enquanto ele explorava o ambiente.

A gratificação estimula o sujeito. A frustração faz com que ele busque ajustamentos criativos. O autocontrole, favorece a deflexão, redirecionando a atenção para algo ou alguém que possa satisfazer suas necessidades.

Os limites impostos a criança favorecem a formação da fronteira de contato e, posteriormente, marcam as diferenças entre EU e TU, dando contorno. Ajustes de qualidade de presença são fundamentais para o processo de desenvolvimento.


3.3.4 A Memória


A neurociência explica que a memória inconsciente envolve diversos sistemas cerebrais: a associação de sentimentos a eventos ocorridos envolve uma estrutura denominada amígdala; a amígdala controla os efeitos dos neurotransmissores sobre a memória, está diretamente ligada às reações de fuga e luta. Quando estamos expostos a estímulos traumáticos a amigdala é ativada.

Outras partes do cérebro são acionadas para outras ações como por exemplo os hábitos motores, como andar ou correr, envolvem o estriado; e as habilidades motoras e atividades coordenadas, como aquelas necessárias para pedalar a bicicleta, envolvem o cerebelo.

Assim, cada parte no cérebro que é destinada a guardar essa lembrança, e ao menor sinal de perigo ela volta mobilizando circuitos cerebrais prejudicados e produzindo uma quantidade absurda de hormônios do estresse. O que traz à tona emoções desagradáveis vividas anteriormente e te protegendo para não as viva novamente. O sintoma é mais bem claro quando inserimos neste ciclo os sistemas emocional, familiar e psicossocial.

No momento em que a repressão acontece, no córtex pré-frontal ântero-lateral, ao mesmo tempo acontece uma diminuição da atividade do hipocampo, uma área vinculada fortemente com a evocação, tanto as memórias extinguidas como as reprimidas podem voltar à tona, quer espontaneamente quer como consequência de estímulos específicos.

Emoções desagradáveis, sensações físicas intensas e ações impulsivas e agressivas, se mostram incompreensíveis e avassaladoras fazendo com que a pessoas se sinta descontroladas. Essas pessoas acreditam sofrer de lesões profundas e irreversíveis.

A princípio a pessoa fará qualquer coisa para desviar sua atenção das experiencias reais, tentará fugir das memórias para as expectativas, racionalizará e criará situações de certo ou errado para não enfrentar a situação real.

Logo o sujeito encontrará furos em sua personalidade, tomará consciência do vazio, e por fim perceberá seu sofrimento alucinante, perceberá que não precisa se torturar, adquire tolerância a frustração e a dor imaginária.



5. A CRIANÇA


Ao nascermos chegamos a está vida em total estado de total vulnerabilidade, toda nossa vida depende de quem fará nosso cuidado, higiene e alimentação. Nossos pais e família em primeira instância são encarregados de nos dar esse apoio. Solidão e abandono fazem com que fiquemos cada vez mais vulneráveis, a dor da carência recebida pode gerar traumas ou entraves para toda vida.

O bebê precisa ter suas necessidades satisfeitas com afetividade e consciência, necessita de oportunidades para percorrer seu caminho com autonomia. Para o bebê deve existir uma pessoa que faça com que isso aconteça, uma pessoa que ofereça limites e confrontos, acolha sua vulnerabilidade e que dê oportunidade a ele, de concertar possíveis estragos.

Em um contexto social o bebê é a projeção de uma situação adulta, onde os sentimentos reprimidos desse adulto acabam sendo atribuídos a essa criança. O bebê é parte do campo onde a mãe está e é ela, a mãe, quem responde a seus anseios, ele precisa ser acariciado, trocado, alimentado. Quando se sente abandonado o bebê chora, períodos de demora em atendê-lo ficam marcados em sua mente, gerando situações inacabadas.

As fases da vida do bebê geram passagens graduais para a vida adulta, a ruptura do campo com a mãe vem com a passagem do desmame para a alimentação sólida, o crescimento dos dentes e o mastigar, todo aprendizado como usar o banheiro, falar conversar, a criança se descobre a cada dia inventando sua realidade.

Se essa criança fica desamparada ou isolada um estado de emergência crônico se instala, sem o cuidado e o carinho do outro ela afunda em seu isolamento. Para Perls, 1977 “Os adultos tratam uns aos outros como inimigos e seus filhos como escravos ou tiranos.” O bebê é considerado isolado, desamparado e onipotente e seu desligamento deve ser feito de maneira segura, considerada como sendo um campo unitário e original.

Para que o bebê desenvolva seu self experiencias sensoriais dosadas de contato, autonomia e abertura precisam estar presentes. Autonomia e abertura faram a moldagem da fronteira de contato, ali serão realizados ajustes criativos e delinearão a formação de sua singularidade como pessoa.

A maneira como a mãe lida com essa criança e seus impulsos agressivos irão favorecer a forma como ele se expressará no futuro. Uma retaliação desses comportamentos pode não favorecer à sua maneira de expressar.

O meio em que a criança está inserida vai afetar diretamente sua singularidade, ela vai se ajustar para a situação. Caso se ajuste funcionalmente, sua qualidade de vida estaria caminhando para o bem-estar, no caso de se ajustar disfuncionalmente, sua qualidade de vida estaria comprometida. A qualidade do contato da criança, e do futuro adulto, na disfuncionalidade, faz com que ela perca da dimensão criativa e a espontaneidade.

Aos poucos o sujeito passa a ser protagonistas de sua própria vida e a tomar decisões, estes ajustes farão com que ele caminhe pelo mundo adulto. Tudo o que o sujeito necessita é afeto, alimento e cuidado. O ser humano se adapta a toda situação seja ela boa ou ruim.

Uma criança que não recebe carinho, atenção e amparo durante sua infância faz ajustamentos, que podem não ser funcionais na fase adulta. Viver em lares onde violência e abusos são cometidos faz com que essa criança se adapte a modos incomuns de vida, faz com que crie ajustes para lidar com esse campo que deixam nela grandes marcas.

As marcas passam de geração em geração, elas ficam impressas na mente, nas emoções, na capacidade de desfrutar de alegrias e prazeres, e até no sistema biológico e imunológico.

Desde a gestação o bebê vai recebendo alimentação e atenção, sem esforço algum, quando nasce o leite flui para sua boca, sem que exija dele maior atenção. Chegam os dentes e ele pode destruir os alimentos, morde e destrói, em seguida, assimila e dá sentido. Aos poucos o bebê aprende, através de suas experiencias, a discriminar o que é nutritivo do que é toxico.

A assimilação entende que o crescimento acontece por meio da apreciação dos elementos nutritivos de cada experiencia. O bebê nasce em confluência com sua mãe, com o amadurecimento do cérebro ele passa a absorver o que está a seu redor.

A introjeção é o processo primário de formação da self, aqui valores e normas vão sendo colocados para o bebê, às vezes, se sobrepondo as necessidades da criança. Um espaço onde possa se expressar e buscar satisfação se faz necessário para que se identifique com o egotismo primário, onde vai se identificar consigo mesmo e desenvolver o autossuporte.

A criança se prepara para o mundo através de sentimentos e ações que não aceita em si mesmo. Quando for capaz de controlar seus impulsos e reconhecer suas atualizações e a do outro ela alcança a retroflexão. Para se defender dos ataques da identidade construída chega à deflexão.

Se o processo for norteado pela forma saudável o desenvolvimento é conquistado. Caso contrário, ligada a cuidados inadequados, a cristalização aparece e a criança deixa para traz conquistas não alcançadas no processo de construção do self, trazendo o risco de adoecimento.

A mãe começa a falhar deixando de atender as necessidades da criança de uma maneira quase perfeita. O bebê, então, vai dando conta destas falhas, e em estado adaptativo, libera a mãe da necessidade de ser perfeita. O bebê vai prestando atenção nos estímulos à sua volta e perceber o que está para acontecer, associa barulhos e cheiros e entende que sua necessidade está para ser saciada.

Se uma criança fica desamparada ou isolada um estado de emergência crônico se instala, sem o cuidado e o carinho do outro ela afunda em seu isolamento. O bebê é considerado isolado, desamparado e onipotente e seu desligamento deve ser feito de maneira segura, considerada como sendo um campo unitário e original.

Uma criança que não recebe carinho, atenção e amparo durante sua infância faz ajustamentos, que podem não ser funcionais na fase adulta. Viver em lares onde violência e abusos são cometidos faz com que a criança se adapte a modos incomuns de vida criando ajustes para lidar com esse campo, que deixam nela grandes marcas. Essas marcas passam de geração em geração, ficam impressas na mente, nas emoções, na capacidade de desfrutar alegrias e prazeres, até no sistema biológico e imunológico.

Para Gestalt-terapia a doença psíquica é definida como uma interrupção, um acidente ou uma inibição no decorrer dos ajustes criativos, conforme se cristaliza o ajustamento ele acaba por comprometer a qualidade do contato com o aqui agora e passa a ser considerado disfuncional.

O processo de adoecimento implica em um comprometimento no processo de desenvolvimento e crescimento. Essa interrupção no processo de crescimento inibe a possibilidade de se realizar ajustes criativos na fronteira entre o self e o outro, assim, perde a permeabilidade ou a nitidez.

O ajuste escolhido pela criança foi a melhor forma encontrada para enfrentar a situação no momento do acidente e, na medida em que é empregado em outros contextos, compromete a qualidade do contato no aqui agora, tornando-se disfuncional.

A agressividade para Perls é fundamental para o processo de desenvolvimento. A destruição da figura que emerge no campo possibilita a assimilação própria e espontânea do sujeito enquanto os elementos tóxicos são descartados.

A agressividade assume postura ativa destruindo o ambiente imaginário e passando a discriminar elementos tóxicos de nutritivos, assim, assimila de maneira autêntica o que lhe agrada. É imprescindível que o cuidado sobreviva ao período de agressividade da criança sem retaliações.

Ao correr risco a criança acaba por acreditar que vai perder a confiança dos pais e acaba se comprometendo nessa relação, podendo ser influenciada por essa interrupção, se adaptando ao que os pais desejam sem construir um senso de confiança próprio.



6. O ADULTO ADOECIDO

Um adulto é um sujeito com pensamentos e sentimentos indissociáveis, com lembranças e afetos. Mente e corpo integrados que resultam no comportamento de cada sujeito e abrange a relação com o outro.

Uma pessoa vista no campo em que vive, nunca será igual a outra, o organismo intervém no ambiente assim como o ambiente intervém sobre o organismo. Na teoria de Kurt Goldesnteim podemos observar que qualquer acontecimento no campo faz com que o organismo se reorganize da melhor maneira possível para atender as necessidades do sujeito.

A cada evento, a excitação vivenciada, faz com que o organismo eleja um ajustamento para a condição em que se encontra. Algo do fundo de possibilidades se destaca, ganha contorno, forma uma figura distinta que vai completar o campo vivido. Gestalts são figuras que se abrem e fecham no contato com o outro, o tempo todo.

O EU presente como pessoa e o TU, a outra pessoa, devem se respeitar e estarem disponíveis um para o outro. É na possibilidade do encontro com o outro que nasce o caminho da transformação. O crescimento acontece na relação com o outro a partir da fronteira de contato.

O adoecimento é uma reação do indivíduo a um contexto que se mostrou desfavorável provocando um bloqueio em sua fronteira de contato. A medida em que recebeu os cuidados na infância a criança se desenvolveu com esses bloqueios em sua fronteira de contato, um sujeito, agora adulto, que se vê cheio de lacunas.

As lacunas de crescimento precisam ser preenchidas para que a autorregulação seja completa, no adulto, a awarness do aqui-agora se integram. O self se desenvolve a medida em que as experiencias vão acontecendo. No contato o sujeito forma seu senso de crenças, valores e atitudes, sobre quem ele é, e sobre as atitudes que toma. Assim, a depender da qualidade do contato, a fronteira pode se tornar flexível, rígida, fechada, difusa ou aberta.

A agressividade para Perls é fundamental para o processo de desenvolvimento. A destruição da figura que emerge no campo possibilita a assimilação própria e espontânea do sujeito enquanto os elementos tóxicos são descartados. Ela assume postura ativa destruindo o ambiente imaginário e passando a discriminar elementos tóxicos de nutritivos, assim, assimila de maneira autêntica o que lhe agrada.

Perls, 2002, faz uma descrição possível entre passado e presente, onde, segundo ele, essa constituição é bastante óbvia, já que, investigamos o passado e a este passado a pessoa vem adicionando continuamente novos fatos.

O treinamento do sujeito o direcionará para a vida, se não forem bem sedimentados ele se deteriorará, podendo cindir. Alguns destes treinamentos, nossa mente esquecerá, outros serão fortes e difíceis de se destruir.

Lembranças passadas interferem nas decisões que tomamos no presente. O sujeito coloca as memórias antigas como sinais de parada onde quer que se pressinta o perigo. Ao se sobrepor uma Gestalt a outra, se aprisiona, reprimi, e sobretudo, mantem a Gestalt errada viva, dissolve-se a última ação e libera energias para a personalidade total funcione.

Uma vez que o sujeito não aprendeu a diferenciar situações passadas das situações presentes, quando essas situações vem à tona, acabam por proporcionar sinais de alerta que restringem as atividades da vida atual.

Criamos hábitos durante a vida, que com a idade ficam cada vez mais difíceis de serem quebrados. Esses hábitos se tornam parte da personalidade do sujeito, e esforços conscientes não conseguem modificá-los sem influenciar o resultado, eles estão limitados a resoluções que corrompem a consciência no momento.

Os princípios são os substitutos para uma perspectiva independente, a pessoa se perde se não for capaz de se orientar por esses pontos de apoio fixos. A pessoa se agarra a esses princípios devido a sua insuficiência de julgamentos.

Hábitos frequentemente são fixados pelo medo, são como reflexos condicionadas e uma mera análise desses hábitos não será suficiente para quebrá-los, quanto a resoluções.

Na tentativa de resolver um problema relevante, o sujeito se repete, hábitos e princípios se alternam para ele enquanto ele tenta solucionar algum problema, o sujeito cria expectativas que por vezes fogem à realidade, quanto mais expectativas, mais difícil solucionar o problema. Toda necessidade perturba o equilíbrio do organismo.

Todas as memórias não assimiladas corretamente, colocam o sujeito em uma relação passado-presente de lembranças traumáticas e introjetadas, que dificultam a vida, para se trabalhar essas memórias traumáticas é necessário considerar os detalhes da assimilação de cada evento. Uma assimilação malfeita promove o desenvolvimento de uma paranoia e do caráter paranoico.

Identificar-se com suas projeções, prestar atenção e observar a realidade, são o caminho para se despertar dessas memórias traumáticas. Assumir as responsabilidades por si mesmo. O sujeito caminha na direção oposta, quando não reconhece ser o responsável por expectativas que ele criou e procura a causa de seus fracasso fora de si,

Para Perls a doença psíquica é definida como uma interrupção, um acidente ou uma inibição no decorrer dos ajustes criativos. Conforme se cristaliza o ajustamento ele acaba por comprometer a qualidade do contato com o aqui agora e passa a ser considerado disfuncional.

O comprometimento no processo de desenvolvimento e crescimento pode iniciar um processo de adoecimento. A interrupção no contato inibe a possibilidade de se realizar ajustes criativos na fronteira EU-TU, assim, perde a permeabilidade ou a nitidez.

O bom funcionamento faz com que a fronteira se alterne entre união e separação enquanto no comprometimento os mecanismos de defesa acabam por se cristalizar a depender da hora da excitação.

Através da agressividade o sujeito assume uma postura ativa, destruindo o ambiente imaginário, e passando a diferenciar aspectos nutritivos dos tóxicos e assume com autenticidade o que lhe agrada.

Merleau-Ponty aponta que o uso que um homem fará de seu corpo é transcendente, enquanto ser simplesmente biológico, para esse autor, gritar na cólera ou abraçar no amor, não é mais natural ou menos convencional que chamar uma mesa de mesa. Assim temos que sentimentos e condutas passionais são inventadas da mesma forma que as palavras.



7. O ADOECER


O imaginário determina a maneira como algumas patologias agem, ao se manifestarem, mesmo nos níveis organísmicos. Adoecer implica na conceituação em que o aspecto concreto é a saúde, implica em uma falta de condição orgânica para enfrentar as manifestações contrárias ao organismo.

Pode-se observar que, cada vez mais, diferentes pacientes tem diferentes reações a uma mesma doença, o início da doença nunca é o mesmo para diferentes pacientes. Observa-se ainda que o efeito de determinado tratamento tem consequência diferente em cada paciente, independente da prescrição medicamentosa utilizada.

O aparecimento da doença desestabiliza o sujeito tornando-o simplesmente paciente. Após a descoberta da doença o sujeito constrói em seu imaginário fontes de sofrimento que transcendem não somente a doença em si, mas sua própria condição de vida.

A dor é uma vivência pessoal e intransferível de quem a sente, torna-se reflexão e intervenção, muitas vezes em total desarmonia com a subjetividade do sujeito, mas não se pode atribuir tudo as emoções do paciente. Temos desde dermatites sendo atribuídas a causas emocionais, sem qualquer preocupação com aquilo que a pessoa possa ter ingerido a definições de câncer e seus desdobramentos, sendo de causa emocional.

Embora as reações orgânicas sejam as mesmas para diferentes sujeitos, as angústias de cada um é diferente da do outro, o sofrimento de um sujeito não pode ser dimensionado com o de outro sujeito. Mesmo que em níveis orgânicos apresentem reações semelhantes a medicação tem efeito diferenciado.

Para Beatriz Cardella, em De volta para Casa, “O sofrimento é um apelo ao outro. Pode ser sustentado ou atravessado quando encontra um rosto humano, quando encontra acolhimento. E o sofrimento de um é sempre de muitos”

A escuta desse sujeito em sofrimento feita pelo profissional da psicologia, deve ser diferenciada pelo olhar humano. A eficácia dessa escuta, diante do desespero e da dor, diante do uso de ansiolíticos e antidepressivos, precisa ser ousada, é necessário a crença na condição humana contra a precisão dos diagnósticos computadorizados.

O uso do imaginário passa a ser a escora da condição humana, ponteando para que se possa continuara crer na possibilidade de transformação a despeito da realidade que se vive e insistir no enfrentamento. Revelar as possibilidades de desdobramento da existência para além do sofrimento que está sendo vivenciado.



8. RESULTADOS e DISCUSSÃO


A forma como o sujeito enfrenta sua vida e como ele aprendeu a se relacionar desde sua infância interfere em sua vida adulta, de forma positiva, quando ele se responsabiliza por seus atos e entende que não pode passar de certos pontos os quais interfeririam em sua saúde mental.

Durante sua infância ele faz ajustes que irão dirigir sua forma de agir na vida adulta, ajustes que farão com que ele desempenhe suas funções com sabedoria integrando sujeito e sociedade. o sujeito se autorregula a depender da situação que está enfrentando.

Ajustes criados na infância e que não foram bem assimilados levarão o adulto a tomar decisões controversas, indo contra suas vontades e desejos, agindo de forma a satisfazer o outro em detrimento a si mesmo.

Bloqueios ou cristalizações na fronteira de contato criados na infância, desestabilizariam o sujeito na vida adulta. As doenças psicossomáticas seriam, então, uma reação a esse ajuste disfuncional, esse bloqueio na fronteira de contato, onde os cuidados da infância não teriam sido o suficientemente bem construídos e agora, na fase adulta, apresenta um sujeito cheio de lacunas.

Cada sintoma que o organismo apresenta tem um significado emocional, o paciente neurótico entende que o simples fato de estar doente é importante. O sujeito em desarmonia sai do seu estado natural. A harmonia é diferente para cada sujeito, assim o mesmo estado adoecido ecoa em uma experiência diferente para diferentes sujeitos.

Ao se perceber com dores recorrentes o sujeito incomodado vai em busca do conhecimento médico, o médico pede exames fisiológicos e anatômicos para diagnosticar sua patologia. Não entendendo o que está acontecendo consigo mesmo, o sujeito, passa a prestar atenção em seu corpo, passa a se conhecer melhor.

A doença psicossomática é a forma que o corpo encontrou para se expressar, dizer que algo está errado. Com a fronteira de contato obstruída e exigindo cuidados, com as lacunas da infância pedem atenção e o sujeito deixa de fluir livremente.

Em Gestalt-terapia podemos dizer que o desenvolvimento visa o crescimento do sujeito em um campo relacional permanente, onde se é parte do todo e um todo em partes, quando nos ajustamos a situações novos sentidos, novas direções aparecem.

A produção de sentido da experiência vivida focaliza-se na criança, é a família que a ajuda a produzir esses sentidos e dar significado as relações. A família é que apresenta à criança a comunidade e a cultura onde vive, é ela que insere a criança no mundo.

Para a criança, sobreviver a própria infância, é um desafio. Algumas vezes ela vai crescer acreditando no que falam sobre ela, sem ter criado seus próprios ajustes na vida, funcionando com ideias que não são dela, mas, dos que a cercam, como que engolindo aos poucos, informações falsas sobre si.

A criança cria memórias, ajusta-se ao ambiente em que vive, cresce com lacunas que dificultaram a vida do adulto. A doença psicossomática se instala quando na desarmonia do organismo, o sujeito se repete, inserindo Gestalten sobre Gestalten e deixando prevalecer a primeira que foi inserida e que continua aberta.



10. CONSIDERAÇÕES FINAIS


A doença Psicossomática é uma doença de fundo emocional e está diretamente relacionada aos ajustes criativos feitos pela criança em sua infância, ao tornar-se adulto essas cristalizações que se formaram na fronteira contato acabam por bloquear o sujeito impedindo-o de funcionar livremente.

Os ajustes se cristalizam em momentos em que a criança se percebeu em dificuldades ou quando não pode se expressar com queria, ainda quando não recebeu a atenção que precisava e na hierarquia na dominância das situações a Gestalten anterior prevalece.

Sujeitos que sofreram abusos ou maus tratos na infância apresentam uma maior possibilidade de ser acometido por doenças psicossomáticas na vida adulta. As Gestalten abertas se sobrepõe fazendo com que a primeira Gestalten se repita toda vez que uma memória equivalente a esse momento passe a ser figura, impedindo que o sujeito tome outra atitude ou decisão.

O imaginário do adulto determina a maneira como algumas patologias agem, ao se manifestarem, mesmo nos níveis organísmicos, mas, cada sujeito é um ser individual e recebe as emoções de maneiras diferentes. Diferentes sujeitos tem diferentes reações em uma mesma patologia.

No decorrer da pesquisa os dados foram demonstrando que a criança quando não tem suas necessidades satisfeitas com afetividade e consciência, perde a oportunidade de percorrer seu caminho com autonomia, o que deixa marcas cristalizadas que perduraram pela vida adulta.

Percebe-se a importância de informar pais e familiares sobre as necessidades da criança em todas suas fases de desenvolvimento, desde antes mesmo de uma gestação. Uma família consciente tem mais condições de criar uma criança saciando suas necessidades afetivas e emocionais o que ajudaria com que ela caminhasse com consciência em sua vida adulta.

Aulas de educação sexual para adolescentes, com ênfase na criação de um filho, poderia prevenir a gravidez precoce, para além de famílias mau construídas



11. REFERÊNCIAS


9. REFERÊNCIAS


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https://repositorio.ufu.br/handle/123456789/15579





Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito parcial à obtenção do título especialista em Gestalt Terapia. out/2021



Selma Bueno Alves

Psicóloga clínica

Neuropiscóloga

Gestalt-terapeuta

CRP 02-22741

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